Sobre o que ver
A arte abstracta costuma ser um grande problema. Mas só o é porque as pessoas têm tendência a não a deixarem ser abstracta. Coitada! Aquela mancha parece um pato, aquela composição parece uma praia. Sabemos que temos a predisposição para gostarmos mais facilmente de algo que nos é familiar e mais dificuldade em aceitar algo que nos é estranho. (Acho que daí vem a nossa resistência à mudança.) Não acho que haja algo de errado nessa predisposição, nem sequer algo pouco natural, só é pena – só isso. Se conseguíssemos afastar essa nossa necessidade de enfiar num círculo o sol, conseguíamos aproveitar bem melhor a fruição estética que uma composição abstracta nos pode oferecer. A brincadeira de olhar para as nuvens e dizer com o que elas se parecem é divertida, mas se calhar se virmos um céu cheio de cores ao final da tarde não vamos lembrar-nos dessa brincadeira, e olhamos apenas para o espectáculo que a natureza nos está a oferecer – e de graça! Estão a ver? É mais ou menos assim que se deve olhar para um trabalho abstracto. Há coisas que podem ser bonitas e agradáveis de se ver simplesmente porque as cores e as formas estão em harmonia a trabalhar para uma experiência agradável. E vê-las como elas são é a melhor maneira de as entendermos. Até torna mais simples julgarmos se gostamos ou não. Mas atenção, não quero com isto dizer que podemos ir por aí a aceitar tudo e mais alguma coisa, há abstracto sem jeito nenhum – mas isso já fica ao gosto de cada um, porque nem todos temos a mesma maneira de ver. Não é de olhar! É de ver!
MJoana
MJoana